sábado, 28 de maio de 2005

A síndrome da cleptomania avaliacional - V - final

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Com esse post espero encerrar a série sobre a “cola”. Encerro a série, mas tenho certeza de que nem de longe encerro o assunto.

A última razão que apontei para a “cola” diz respeito à conivência com que ela é tratada. Assim, vamos ao quinto item:

5 - O professor é conivente com a cola ou despreparado para inibi-la.

O que é ser “conivente”? Ser conivente é compactuar com algo de que, por princípio, discordamos; é fazer vistas grossas a algo que julgamos ser errado, mas que decidimos tolerar por uma razão qualquer que nos pareça bastante boa.

O professor é conivente com a cola quando a permite, quando a facilita ou mesmo quando não a impede ou não a dificulta, mas, principalmente, ele é conivente quando não toma nenhuma medida que vise erradicá-la.

A ameaça de punições, ou mesmo as punições previstas nos regimentos escolares, já se mostraram suficientemente ineficazes para impedir ou mesmo desestimular a cola. Como vimos no post anterior, as punições para os alunos que colam não atingem todos os “colantes”, não causam desestímulo suficiente e, na maioria das vezes, são antipedagógicas, pois nada ensinam.

Métodos operacionais, tais como: misturar alunos de diferentes séries em uma mesma sala nos dias de prova, fazer várias provas para uma única classe, vigiar incessantemente os alunos, ou qualquer combinação desses métodos, podem ajudar a desestimular a cola, mas não a impedirão e nem contribuirão para que ela seja erradicada como “método de obter nota”.

Talvez seja por essas tantas razões que muitos professores tornaram-se coniventes com a cola e simplesmente passaram a ignorá-la, mas não é só por isso. Muitos professores também colaram quando estavam na escola e, portanto, eles mesmos não vêem na cola nada mais do que uma “esperteza” do aluno. Há mesmo quem acredite que “TODOS” colaram algum dia em alguma prova.

Daí segue-se, creio eu, a conclusão natural de que muitos professores estão despreparados para lidar com a situação de “cola”, pois colaram na escola, tornaram-se professores apesar disso e, atualmente, já não dispõem nem mesmo dos métodos toscos de coação de que seus antigos mestres dispunham. Nada mais natural que diante desse quadro se faça vistas grossas à “cola”, não é?

Não, não é, ou, pelo menos, não deveria ser assim.

Se racionalmente concordamos que o aluno que cola o faz por uma série de boas razões e, além disso, concordamos também que seria melhor que ele não colasse, por mais justas que sejam as razões pelas quais ele cola, então não podemos fazer vistas grossas e nem nos conformarmos que “é assim mesmo e no final das contas todo mundo cola”.

Se o aluno cola para obter nota porque damos a essa nota um status artificial de “qualidade” para o aluno, então talvez devêssemos retirar da nota esse poder de transformação que faz com que bons meninos tenham que roubar nota para manterem sua dignidade de pessoas. Podemos fazer isso se deixarmos de usar a “nota” do aluno como elemento de chantagem, como discriminante entre os próprios alunos, como fator de reprovação ou simplesmente como uma medida da “qualidade da pessoa”. Se a nota não tiver valor, quem vai querer roubá-la? Alguém rouba folhas de grama dos jardins ao invés das flores?

Se o aluno se sente inseguro sobre o que aprendeu e procura colar porque com isso ele terá o respaldo de outro, seja de um colega, seja do livro, seja do seu próprio caderno ditado pelo professor, então talvez possamos avaliá-lo de uma forma em que suas respostas não sejam comparadas a um “padrão” inflexível, mas sim que sejam valorizadas por aquilo que têm de certas e, da mesma forma, que seus erros sejam reparados no próprio processo de avaliação como forma de reforçar a aprendizagem e não como forma de punir o aluno.

Se o aluno cola porque isso lhe parece ser a coisa mais natural a fazer, então precisamos esquecer um pouco o conteúdo específico de nossa disciplina para refletirmos com ele sobre o que é certo e o que é errado, temos que falar de ética sim, porque não? Nossos alunos precisam saber que o certo não é tudo aquilo que pode ser feito sem que se seja punido, precisam saber que a cola não é um “pecado contra a santa madre escola”, mas sim um pecado contra sua própria formação como cidadão.

Se o aluno cola porque dificilmente será punido, ou será punido de forma tão ineficaz que colar ainda lhe parecerá ser vantajoso, então não adianta querermos puni-lo com as leis de Talião, mas talvez possamos convencê-lo de que ele será muito menos punido e muito mais premiado se não colar. Não adianta punirmos os alunos que colam se não sabemos premiar aqueles que não colam.

Por fim, se estamos despreparados para lidar com a “cola” e se não conseguimos dar conta das quatro demandas acima, então isso também não significa que devamos lavar as mãos e fazer de conta que estamos em outro mundo, um mundo perdido no caos onde nada mais dará certo, mas talvez devamos reconhecer que precisamos mudar nossas práticas, mudar nossa escola, mudar a nós mesmo e depois, somente depois, poderemos pretender mudar nossos alunos.

Bom, era isso que eu tinha para dizer sobre a cola.

Fui...

quinta-feira, 26 de maio de 2005

A síndrome da cleptomania avaliacional - IV

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Voltando ao tema da “cola”, vamos tratar agora da quarta razão apontada para a cola dos alunos:

4 - A punição nunca é tão freqüente e suficientemente desencorajadora em comparação com os "benefícios" da cola, isto é, a relação custo-benefício indica que "colar compensa".

Primeiramente vamos recordar que só são punidos os alunos que são efetivamente pegos colando e estes representam um número muito pequeno quando comparado ao número total de alunos que admitem colar. Aliás, é curioso como uma quantia razoável de alunos “admite”, com uma naturalidade incrível, que cola nas provas. Alunos que não são flagrados colando raramente são culpabilizados, pois é relativamente difícil provar que um aluno colou com base apenas na sua resposta escrita.

Assim, para que um aluno que cola possa ser punido, ele precisa primeiro ter sido pego em flagrante. Cenas em que se vê o professor tenso andando incansavelmente pela sala, olhando desconfiado para todos os cantos e despindo seus alunos com os olhos em busca de papeizinhos escondidos embaixo das carteiras, no estojo ou nas palmas das mãos, são cenas que todos já vimos e que talvez já tenhamos encenado também.

Vigiar uma sala de trinta, quarenta alunos, no mínimo, tratando a todos como potenciais criminosos prestes a cometerem um delito, não me parece ser muito apropriadamente uma tarefa pedagógica. Talvez se pareça muito mais com a tarefa dos seguranças de grandes lojas e hipermercados, que se esforçam para que ninguém esconda sobre a roupa alguma bugiganga qualquer. Mas essa é a função do professor no “dia da prova”, dia em que ele sabe que “não dará aula”, dia algumas vezes visto como “a oportunidade de vingança”.

Em tempos idos, e graças damos por não voltarem mais, era comum professores “revistarem” alunos suspeitos, revirarem seus estojos, bolsos e bolsas. Alunos eram obrigados a dobrarem as mangas, mostrarem as palmas das mãos e os assentos das suas cadeiras. Quem não se lembra disso que dê graças.

Nesses tempos, e em muitos casos ainda hoje, quando um aluno era pego colando ou tentando colar, tinha sua prova anulada e ficava com nota zero. Pouco importava se havia colado a prova toda, uma resposta apenas ou mesmo que nem houvesse colado coisa alguma. A punição era imputada ao seu comportamento antiético, discutido no texto anterior sobre esse tema, e em nome dessa ética se abolia a “avaliação” propriamente dita, substituindo-a por uma medida punitiva que, na prática, significava o mesmo que reduzir o conhecimento do aluno a nada. Alunos pegos colando sempre foram igualados aos alunos que nada sabiam, à escória "incapaz de acompanhar as aulas” e “imprópria para a escolarização”.

O aluno “colador”, quando era pego, era exposto e execrado em praça pedagógica pública. Primeiro era exposto ao ridículo diante dos colegas da classe, depois ia para a diretoria, onde ouvia absurdos sobre o ato inominável e abominável que houvera cometido contra o sacrossanto sistema de avaliação escolar e, por último, era entregue aos pais, carrascos finais que, humilhados pelo comportamento dos filhos, encarregavam-se das punições domésticas. Alguns pais e educadores acreditavam que esse era um sistema muito eficaz e desencorajador. Mas não era. Esse sistema apenas permitiu que se produzisse na escola “especialistas em cola”, que se desenvolvessem métodos brilhantes de ocultação de provas e, finalmente, que a “esperteza de quem não é pego” fosse valorizada a tal ponto que alunos que colavam e não eram pegos tornavam-se “alunos brilhantes”.

Hoje em dia muita coisa mudou. Já não se pode mais “revistar alunos” impunemente, revirar suas coisas, humilhá-lo diante da classe e nem mesmo puni-lo com “nota zero”. E, embora muitos professores e diretores imaginem que isso é ruim, a verdade é que isso é muito bom. O aluno que cola não é um delinqüente, a cola não é um crime abominável e a prova, essa que passa quase desapercebida nessa história, não é realmente um bom instrumento de avaliação do aprendizado.

A história já nos ensinou que as punições aplicadas para inibir a cola, mesmo quando eram absurdamente desproporcionais, inumanas, e mesmo criminosas, não surtem o efeito desejado. Já sabemos que não é possível punir sempre, não podemos punir todos e nem podemos punir de qualquer maneira e na proporção de nossas vontades. Mas se punir não resolve, então o que podemos fazer? Será que só nos resta sentar e chorar?

Talvez haja outra saída e se possa encontrá-la procurando melhor e em lugares mais acertados. Podemos começar essa busca refletindo sobre os textos anteriores dessa série, onde já discutimos algumas das razões dos alunos colarem, mas também podemos nos perguntar se os alunos colariam com tanto afinco e sujeitos a tantos riscos se não almejassem um prêmio tão valioso: a nota que os representa como “pessoas classificadas por competência”.

Se pudermos resumir todo o aprendizado do aluno em uma única nota, obtida em uma única prova, talvez duas, e se essa nota representar oficialmente esse nosso aluno diante da comunidade, então talvez o aluno veja grandes razões para se preocupar em “conseguir uma boa nota”, ou seja, ele terá bons motivos para colar. Mas será que esse aluno colaria se suas avaliações fossem diferentes?

Se um aluno for avaliado todos os dias, por todos os seus atos, todos os seus trabalhos e atividades, por sua participação, colaboração, empenho, enfim, por tudo aquilo que ele realmente é ao longo de um determinado período, geralmente um bimestre, será que ele colará? Colará seu empenho, sua participação, suas atividades, seus trabalhos? Colará quando estiver trabalhando em grupo? Colará quando não houver uma “nota” para avaliá-lo?

Enquanto o aluno for avaliado por uma nota e essa nota for produto de uma avaliação parcial, incompleta, estressante e baseada em sua capacidade de reproduzir (colar!) um determinado conhecimento que não é dele, certamente a relação custo-benefício da cola será francamente favorável a esta última. Em um sistema de ensino onde os alunos são avaliados por provas apenas, e essas provas nada mais são do que um conjunto de perguntas ou problemas cujas respostas e soluções já estão “prontas”, colar é benéfico ao aluno; não porque isso seja uma atitude correta que ele deva ter, mas porque ela é menos incorreta do que simplesmente sujeitar-se a ser classificado espuriamente por um instrumento ruim: a prova.

Fica então uma última pergunta para nossa reflexão: colar é um verbo transitivo ou intransitivo?

Fui...

segunda-feira, 23 de maio de 2005

Educação e mercado - problema ou solução?

Uma pequena pausa na série sobre a "cola" para postar uma pequena provocação...


Com o sucateamento da escola pública nas últimas três décadas, o número de escolas privadas aumentou vertiginosamente, tanto no ensino fundamental e médio quanto no ensino superior; tendo este último apresentado um crescimento de 50% na década de 90, segundo o INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).

Enquanto a escola pública de níveis fundamental e médio restou aos pobres, a classe média migrou em massa para a rede privada nesse segmento de ensino. Somente no ensino superior é que o panorama é um pouco diferente, já que as universidades particulares abrigam na sua maioria a classe média baixa e o operariado, e as universidades públicas continuam sendo eminentemente elitistas.

Esse movimento de migração para as particulares criou um novo paradigma no ensino: a "escola-produto". Essa nova escola, consumível e descartável, como qualquer mercadoria de shopping center, tanto incorporou em si alguns elementos de gestão típicos da empresa privada, e escassos nos segmentos públicos, como a exigência de um "padrão de qualidade de atendimento voltado à satisfação do cliente", quanto alguns elementos estranhos à pedagogia das escolas de outrora, como a figura do "professor-produto".

Entendemos aqui o termo "professor-produto" como aquele que deve satisfazer às exigências de sua clientela - os alunos - como pressuposto mais importante para o exercício de sua função do que os pressupostos de competência pedagógica e domínio de sua área. Assim, tanto se viu surgirem professores show-men, que cantam fórmulas e tocam violão em aulas de matemática, quanto insurgirem outros que não conseguem ver no aluno apenas um "cliente" a ser satisfeito e nem na escola um balcão de ofertas pedagógicas.

Professores que antes eram avaliados por sua formação acadêmica e pelo domínio em sua área de conhecimento, agora se viram repentinamente avaliados por "ibopes" levantados diretamente com os alunos. Ibope baixo é demissão certa. Alunos que antes "aprendiam" passivamente e eram obrigados a se adaptarem aos seus professores viram-se, de repente, no controle da situação e, armados de frases como "sou eu quem pago seu salário", passaram a ditar novas normas de relacionamento e até mesmo avaliarem a "didática" de seus professores ou a qualidade do conteúdo que aprendem na escola.

Para alguns essa situação representa uma inversão de valores, onde o processo de ensino-aprendizagem perdeu seu rumo e a escola passou a ser apenas mais uma lojinha de shopping onde se compra algum tipo de satisfação imediata. Para outros a escola se "profissionalizou" e incorporou novas práticas de gestão democrática. Para quem vê o Brasil "de fora", no entanto, continuamos apenas sendo o rodapé de todas as avaliações internacionais que medem a qualidade do ensino.

sábado, 21 de maio de 2005

A síndrome da cleptomania avaliacional - III

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Depois de algum tempo sem comparecer nesse blog, consegui finalmente um tempinho para dar continuidade à série sobre a cola. Nesse post eu comento a terceira razão pela qual, a meu ver, os alunos colam:

3 - O aluno acredita que colar é "normal" e parte do procedimento de ensino-aprendizagem, uma parte "extra-oficial", mas que já está incorporada à prática escolar por todos.

É claro que para falar em “normalidade da cola” precisamos falar em “ética”.

O termo “cola”, além da acepção natural: [Do gr. kólla, 'goma'.] S. f. 1. Substância ou preparado glutinoso para fazer aderir papel, madeira e outros materiais; goma - tem também uma segunda acepção, “brasileira e educacional” - 2. Bras. Cópia feita clandestinamente nos exames escritos; fila.

Colar é isso mesmo: copiar de forma clandestina, isto é, não autorizada, em exames (não apenas escritos); é também sinônimo de “furto”, “trapaça”, “desonestidade”.

Reparem bem que “copiar de forma clandestina” é cola, é feio e deve ser punido, mas nem toda cópia é clandestina, não é? Quantas e quantas vezes professores obrigam seus alunos a colarem respostas do livro no espaço destinado a elas nos seus cadernos? Quantas e quantas vezes um pequeno descuido nessa cópia é chamado de “erro”, pois está “diferente do livro”? Quantos questionários com respostas padronizadas já não foram “decorados” para as provas?

Quem cola quer copiar, não quer produzir, não quer criar, não quer interpretar, não quer opinar, não quer participar com seu conhecimento próprio... Mas, diabos! Não é exatamente isso, produzir, criar, interpretar, opinar, participar, etc., que um número gigantesco de alunos aprendem que não devem fazer na escola?

Quando se enfatiza nas escolas que o que importa no processo de ensino-aprendizagem é a posse de um suposto “conhecimento correto”, em detrimento de outros alternativos, incompletos, brutos e mesmo absurdos, e quando se atribui valor apenas à capacidade do aluno de fornecer as respostas “esperadas”, se está justamente aniquilando sua capacidade criativa, sua iniciativa como ator do processo de ensino-aprendizagem e sua capacidade de articular seus conhecimentos.

O aluno que conseguiu decorar as vinte perguntas e respostas do questionário que o professor preparou para a prova, e que consegue reproduzir dez dessas respostas na prova, ficará com nota dez e será considerado “brilhante”. O outro, que colou as dez respostas do primeiro, também tirará dez e será considerado brilhante. Um terceiro, que tenha decorado apenas cinco respostas, será considerado apenas “regular” e, finalmente, um quarto aluno que tenha decorado apenas duas respostas será considerado “medíocre”. Mas a grande verdade é que um mês depois, ou quem sabe um ano ou uma década, todos os quatro terão esquecido as respostas, tenham elas sido decoradas ou não. A quem faltou ética? Ao aluno que decorou as respostas, mas que será incapaz de lembrar delas alguns dias depois, e que talvez nem saiba o que elas significam? A quem se lembrou apenas de parte das respostas? Ou seria a quem decidiu que, sendo inútil decorar as respostas, melhor seria arrumá-las de qualquer maneira e despender seu precioso tempo fazendo coisas mais agradáveis do que decorar respostas inúteis?

Arrisco-me a dizer que, se faltou ética, faltou ética ao professor que deu como única opção ao aluno “colar” as respostas, quer tenha sido uma “cola de memória”, quer tenha sido uma “cola do colega” ou, ainda, uma “cola do papel-lembrete”. Mas o mais curioso é que para nenhum desses citados acima terá faltado ética segundo a “ética escolar”, pois somente o aluno que é “pego colando” é que leva a pecha de “desonesto”. Alunos que colam e não são pegos são tratados como “bons alunos”, pois nessa ótica míope, onde apenas as notas dos alunos os classificam como “bons” ou “ruins”, o aluno que cola e não é pego tem os mesmo predicados do outro capaz de decorar tudo: ele tem nota! E não é raro se ouvir dizer que o aluno que “sabe colar” é “esperto” e que o que é pego colando “é tão burro que nem sabe colar”. E se for esse tipo de ética que a escola quer ensinar e valorizar, então não seria melhor fechar as escolas?

A meu ver é mais do que natural que a ética dos alunos que colam seja a mesma ética de muitos professores: uma ética imediatista e pragmática, baseada em resultados mensuráveis, inumana e indiferente aos métodos empregados no processo de ensino-aprendizagem. Então, chamar os alunos que colam de “desonestos” não passa de pura hipocrisia, pois o próprio sistema os ensina a colar o tempo todo e os reprime sempre que não conseguem colar corretamente ou que se arriscam a dar "respostas próprias".

Colar, para o aluno, não é antiético, pois não é nada além do que executar um procedimento de rotina do seu processo de ensino-aprendizagem, algo que lhe foi sendo ensinado anos a fio, para se assegurar de que sua resposta não seja dele mesmo, mas sim de alguém cuja autoridade se apresenta como validadora dessa resposta: o professor, o livro, ou ambos.

Porque tantos alunos sempre perguntam se as respostas devem ser dadas "à lápis ou à caneta", ou então se devem ser escritas "com as próprias palavras"? Quem nunca ouviu essas perguntas? Seriam perguntas realmente tolas, ou teriam por trás delas um processo de aniquilação da criatividade e da individualidade do aluno em troca de "respostas corretas"?

Mas o que dizer do aluno que não estudou nada e copiou tudo do colega ao lado, mesmo que o colega ao lado também não saiba as "respostas corretas"? Não seria esse aluno um "folgado" a agir de forma desonesta?

Talvez sim, talvez não. A pratica mostra que quase ninguém cola de outro colega se não achar que esse outro colega sabe mais que ele, ou seja, se não vir no colega uma forma de “validar” as respostas. Isso parece lógico do ponto de vista da lógica míope de resultados em forma de notas. Quem tem boas notas é “bom”, logo, é uma fonte confiável para se colar. Mas a prática também mostra que muitos colam de colegas tão “ruins de nota” quanto eles mesmos. Porque será? Desonestidade? Burrice? Ou seria... Hábito!

Reproduzir repostas alheias é tão comum na escola que até mesmo a reprodução de uma resposta profundamente “suspeita”, vinda de um aluno sabidamente “ruim de nota”, torna-se melhor do que arriscar uma resposta própria do aluno quando este já se convenceu de que suas respostas não têm valor se não forem respaldadas em “alguma coisa fora de sua mente”. A insegurança que se aprende na escola, a ética de resultados em forma de notas e a falta de estímulo ao protagonismo são profundamente visíveis nesse comportamento aparentemente “ilógico” de se abrir mão de uma resposta própria para se copiar outra que, sabidamente, estará errada.

Em uma avaliação onde os alunos são informados antecipadamente que podem consultar qualquer material (embora nenhum deles contenha "respostas prontas"), menos os colegas (isto é, não devem colar), e onde suas notas não terão qualquer valor, ou seja, onde podem errar a vontade sem serem punidos por isso e onde não serão premiados pelos acertos, ainda assim se verifica que alguns alunos “colam” dos colegas! Porque colam então? Desonestidade? Vê-se que o “buraco” é bem mais abaixo, não é?

Bom, por hoje chega. Fui...